Carta de uma adulta estressada para o
Departamento Celestial: “Tire-me daqui!”
By Josimara Neves
Digníssimo Diretor do Departamento
Celestial:
Imagino que tenha muitas solicitações e pedidos e como
eu não sei como é a questão da conexão da internet aí em cima, resolvi escrever
uma carta bem direta.
É o seguinte: sei que como adulta estou me comportando
como uma adolescente rebelde e malcriada: não suporto falação na cabeça, não
tenho saco para conversas pra boi dormir, não dou conta de escutar as pessoas
dizendo as mesmas coisas como se fossem inéditas e super originais, não vejo a
vida como a maioria das pessoas, não me encaixo nesse mundo:
S-O-C-O-R-R-O!
Quero sair daqui, sei lá, viajar para outras galáxias,
bater um papo com o Raul Seixas no além, cantar “Pais e filhos” com o Renato
Russo onde quer que ele esteja, andar de aeróbus, plantar bananeira, sentar na
jaca, sei lá, qualquer coisa que me pareça menos entediante do que “as mesmas
praças, as mesmas flores, os mesmos jardins”.
Quero plantar
favas, ter aquelas conversas desconexas, mas que sejam engraçadas, quero falar
coisas sem pé nem cabeça, quero descer do salto e me comportar como uma criança
feliz que “rouba” o brigadeiro da festa e sente que aquilo é que faz a vida
valer à pena ou que solta um pum e não se sente reprimido, quero rir até dar
câimbra facial, quero sentar sem modos, comer sem etiquetas, ter o prazer de
conversar com outra mulher sem que ela fale de corpo, bunda, dieta, peso e
todas as terríveis e insuportáveis bitolações femininas que, sinceramente,
enrugam a minh’alma, franzem as minhas vísceras, dão celulite no meu cérebro, atormentam
o meu estado de espírito, me fazem sentir que eu nasci ou no corpo errado ou na
época errada! Meu Deus, será que eu sou fruto de um equívoco? Sim! Só pode! Porque
quando eu falo dizem que sou doida, quando rio me dizem que a minha risada é
escandalosa para não dizerem que é inapropriada para a ocasião, porque quando esboço o que eu penso, costumam dizer que sou
profunda e complexa: serei eu um oceano profundo cujas águas incertas me fazem
incompreendida? Não sei dizer, acho que preciso aprender com os moluscos,
talvez com as ostras frustradas por produzirem pérolas lindas, mas que só são
valorizadas pelo valor comercial e não pela sutileza trabalhosa com que são
produzidas? Serei um mamute com crise de identidade achando que sou um gambá?
Ou será que a minha crise de identidade é similar ao do palhaço do filme de
Selton Mello que se divide entre “identidade e RG?” São tantas indagações e
queixas, Senhor, que eu vou me limitar, depois de ter rodeado bastante, a ir
direto ao ponto: “não sei para qual departamento mandar a minha carta
solicitando a transferência para trabalhar em Marte, só sei que por aqui não dá
mais! Se precisar passar uma temporada no espaço para eu passar por um estágio
probatório eu vou, se precisar vender gelo para esquimó eu vendo, se precisar de
um atestado de insanidade mental eu providencio, se for necessário ter um surto
eu simulo, se precisar fingir que eu falo esperanto eu tento, se me perguntarem
se eu entendo aramaico eu confirmo, porque sinceramente, pra mim, se eu
continuar morando aqui - nesse planeta
-falando português e as pessoas achando que eu falo grego eu prefiro aprender
libras em algum pequeno mundo ainda a ser descoberto pelo Pequeno Príncipe.
Caso não seja possível enviar-me pra Marte, me transforme numa princesa para eu
me casar com ele e viver dentro do minúsculo asteroide B612, porque, na moral,
ninguém merece viver numa bola tão gigantesca – nesse mundo tão vasto - com
pessoas que o transformam em um ovo de codorna!
Espero ser atendida em minha solicitação!
Desculpe-me por ser adulta! Ops! Estressada! Mas me
digam: eu tenho ou não tenho (as minhas) razões?
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